Casamento Avuncular e Casamento In Extremis: decisão do STJ é exemplo de
ativismo judicial?
A edição 20 da Revista Científica do IBDFAM traz em seu
conteúdo o artigo “Casamento Avuncular e Casamento In Extremis - O Julgamento
do Recurso Especial N° 1.330.023: Um exemplo de Ativismo Judicial?”, escrito
pelo advogado e professor Cristian Fetter Mold, membro do Instituto. Ele estava
no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em novembro de 2013, quando os
ministros, sob Relatoria da Ministra Fátima Nancy Andrighi, analisaram um caso
raro em que, na mesma hipótese ocorreu uma cerimônia de casamento Avuncular e
In Extremis.
“Durante a sessão, pensei seriamente em escrever a respeito,
pelo ineditismo do caso e por conta das soluções encontradas pela Corte.
Posteriormente, participando do Programa de Mestrado, assistindo as aulas do
Professor Paulo Gonet Branco sobre o fenômeno do “Ativismo”, o tema voltou-me,
mas não só sob uma perspectiva meramente de Direito Civil, mas sim, de modo
mais abrangente, uma vez que achei necessário investigar se a decisão oriunda
do STJ havia sido ‘Ativista’ e em que medida, sobretudo porque em alguns
trechos pareceu que a literalidade do Código Civil poderia ter sido afastada,
havendo criação de verdadeiras regras novas. De posse de tais dúvidas,
questionamentos e angústias, vi a oportunidade de escrever a respeito”,
recorda.
De acordo com o autor, o artigo faz uma apresentação do
estado da arte da doutrina brasileira, em matéria de Casamento Avuncular e
Casamento In Extremis, demonstrando ainda como as matérias evoluíram, desde
antes do Código Civil de 1916 até os dias atuais. Posteriormente, ele apresenta
o acórdão que julgou o Recurso Especial 1.330.023/RN e os principais pontos em
debate, ou seja, além do fato de o noivo não poder se manifestar de viva voz, a
própria validade do casamento avuncular e, ainda, o fato de as seis testemunhas
não terem sido “convocadas pelo enfermo”, conforme a literalidade do artigo
1.541, I, do Código Civil, mas sim pela sobrinha sadia.
A seguir, após uma breve apresentação de algumas teorias
acerca da figura do Ativismo, ele retorna às soluções encontradas pelo STJ para
validar o aludido matrimônio e opina sobre ter ocorrido ou não uma postura
Ativista no enfrentamento e superação das polêmicas, a lembrar que, ao final, o
acórdão julga pela validade da cerimônia, com óbvios efeitos ex tunc. “O artigo
busca levantar reflexões acerca dos temas acima discorridos: formas especiais
de casamento, impedimentos matrimoniais, influência do direito estrangeiro e do
direito Canônico, e isso somente no âmbito do Direito Civil, digamos puro. A
seguir, ao fazermos o cotejo desses institutos e da incrível hipótese fática enfrentada
pelo STJ com a questão do “Ativismo”, vemos que soluções simplistas e açodadas,
do tipo: 'Houve Ativismo na decisão e isso é aprioristicamente bom e desejável'
ou 'isso é aprioristicamente ruim e indesejável', talvez não reflitam
exatamente o que ocorreu”.
Cristian Fetter Mold explica que o Casamento Avuncular é o
casamento entre parentes colaterais de terceiro grau, ou seja, tios(as) e
sobrinhos(as), a princípio vedado pela letra fria do Código Civil, artigo
1.521, IV. Já com relação ao Casamento In Extremis, também chamado In Articulo
Mortis ou Casamento Nuncupativo, é o casamento da pessoa que se acha em
iminente risco de vida, não obtendo a presença da autoridade à qual incumba
presidir o ato, nem a de seu substituto, podendo então celebrar o casamento na
presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham parentesco em
linha reta, ou, na colateral, até segundo grau, segundo a literalidade do
artigo 1.540 do Código Civil.
INDETERMINAÇÃO SEMÂNTICA
O ativismo judicial vem cada vez mais se impondo, como foi
pelo casamento homoafetivo, multiparentalidade, equiparação entre casamento e
união estável para fins sucessórios, entre outras medidas. Qual sua opinião com
relação a esse fenômeno?
Acredito que antes de emitirmos qualquer opinião a respeito
do fenômeno do “Ativismo”, ou de uma decisão judicial supostamente “Ativista”,
o mais importante é conseguirmos chegar a uma conceituação segura sobre o que
seja realmente uma decisão “Ativista”. O próprio Professor Paulo Gonet, um dos
inspiradores deste artigo e uma das maiores autoridades no assunto, costuma
dizer que mesmo nos Estados Unidos, onde a expressão foi empregada pela
primeira vez, há cerca de 70 anos, o termo ainda padece de indeterminação
semântica.
Observa-se que para muitos, toda vez que a decisão de uma
Corte Superior parece destoar de um Princípio de separação de poderes, esta é
tachada de “Ativista”, não sendo raro encontrarmos autores que acreditam que
tal postura é sempre negativa e indesejável e outros que entendem que tais
decisões são um reflexo de uma necessária ampliação das funções jurisdicionais,
para que ocorra uma contínua tarefa de controle de constitucionalidade em
benefício de sociedades mais complexas e pluralistas e/ou ainda em defesa de
parcelas minoritárias da sociedade, contra a chamada “ditadura da maioria”.
Não podemos esquecer também a opinião do jurista Lênio
Streck, segundo o qual o Presidencialismo de Coalizão e as tensões constantes
entre Executivo e Legislativo, muitas vezes empurram as grandes questões para
as Cortes Superiores, as quais para o bem ou para o mal, não se furtam a
encontrar soluções, muitas vezes criando novas regras ou interpretando regras
velhas a ponto de dar-lhes quase uma nova roupagem.
De qualquer forma, procuro ainda demonstrar no meu texto que
ao repartirmos a decisão do STJ e analisarmos ponto a ponto os principais
aspectos que estiveram em debate, podemos ver claramente que em alguns aspectos
não houve verdadeiro “Ativismo”, mas sim soluções encontradas no próprio
ordenamento.
Por exemplo, discutiu-se se o casamento do tio com a sobrinha
poderia ser invalidado pelo fato de o noivo moribundo não ter conseguido se
manifestar de viva voz, externando seu consentimento por gestos. Ora, as
testemunhas foram unânimes em dizer que o noivo, embora não pudesse falar mais,
estava consciente e declarou sua vontade por gestos. Assim o STJ entendeu que
estava cumprido o requisito contido no artigo 1.541, II e III do Código Civil.
Nesse ponto não se pode dizer que houve “Ativismo”.
Será que podemos dizer que houve “Ativismo” em outras
questões tais como você colocou? No caso da equiparação sucessória entre
cônjuges e companheiros, por exemplo, o Supremo declarou a
inconstitucionalidade do criticadíssimo ab ovo art. 1.790 do Código Civil. E
quando há a modulação dos efeitos apenas para o futuro, como parece ser o que
vai ocorrer? A discussão sobre Ativismo aqui pode ser bipartida? Me parece que
sim.
Advogado em Brasília esclarece que o artigo foi publicado na edição 20 da Revista IBDFAM -
Famílias e Sucessões
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